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A nova lógica jurídica da tributação “por fora” do IBS e CBS, segundo Roberto Peroba

Markus Winkler via Unsplash

Por Luiz Roberto Peroba

Introdução

A Reforma Tributária instituída pela Emenda Constitucional nº 132/2023 trará uma mudança jurídica estrutural na forma como as empresas brasileiras formarão seus preços, reconhecerão suas receitas e apresentarão suas demonstrações financeiras.

A substituição do ICMS, ISS, PIS e COFINS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) implica a adoção obrigatória da tributação “por fora”, com destaque separado do valor dos tributos em relação ao preço da operação.

Essa alteração, embora positiva do ponto de vista da transparência tributária, exigirá adaptações contábeis e estratégicas profundas, com impactos diretos sobre os balanços patrimoniais, as demonstrações de resultados e a avaliação econômico-financeira das empresas.

O objetivo deste artigo é explicar de maneira prática e técnica os principais efeitos dessa migração, permitindo que as empresas compreendam as mudanças, analisem os impactos potenciais e adotem medidas para neutralizar riscos ou mesmo aproveitar oportunidades geradas pelo novo ambiente tributário.

I. Do Modelo “Por Dentro” ao Modelo “Por Fora”: A Mudança Conceitual

Atualmente, o sistema de tributação do consumo no Brasil admite que tributos como ICMS, ISS, PIS e COFINS integrem o preço final da operação.

Em especial, o ICMS incide “por dentro” da base de cálculo (art. 13, §1º, I, da LC nº 87/1996), fazendo com que o preço de venda já contenha o imposto.

Com o novo sistema, conforme o art. 156-A, §5º da Constituição Federal, o IBS e a CBS deverão ser destacados separadamente. O preço da operação corresponderá, por uma definição jurídico constitucional, apenas ao valor da mercadoria ou serviço, e o tributo será adicionado de forma visível e apartada.

Essa alteração afeta a lógica de precificação, a composição das receitas e a dinâmica de gestão financeira das empresas.

II. Impactos Financeiros da Tributação “Por Fora”

II. 1. Reconhecimento da Receita: A Nova Dinâmica da Receita Líquida e dos Indicadores de Performance

A mudança para a tributação “por fora” altera profundamente o modo como as empresas registrarão suas receitas nas demonstrações financeiras:

– Receita Bruta Real: O valor registrado como receita bruta passará a refletir apenas o valor do bem ou serviço, sem qualquer inclusão de tributo;

– Tributos como Passivo: IBS e CBS destacados terão característica de passivos fiscais, e não como parte da receita. Os efeitos práticos deverão ser: (i) Redução aparente da Receita Bruta; (ii) Impacto nos indicadores financeiros; (iii) Necessidade de ajustes em “covenants” (obrigações contratuais que impõem limites ou metas relacionadas a indicadores financeiros).

Apenas para ilustrar a situação, vale trazer o seguinte exemplo prático: Uma empresa de varejo que hoje fatura R$ 1 bilhão, com ICMS médio embutido de 18%, passará a registrar uma Receita Bruta de cerca de R$ 820 milhões. Sem ajuste, múltiplos como EV/Receita ou EV/EBITDA poderiam ser artificialmente ampliados, impactando avaliações de mercado, negociações de dívida e compliance com índices contratuais.

II.2.  Separação de Ativos e Passivos Fiscais: O Novo Peso do Crédito Tributário nos Balanços

Além da mudança no reconhecimento da receita, o novo modelo de IBS e CBS — com não cumulatividade plena — impõe a necessidade de gerenciamento ativo dos créditos e débitos tributários : (i) Créditos sobre aquisições deverão ser registrados como ativos fiscais e (ii) Débitos sobre vendas serão registrados como passivos fiscais.

Os potenciais efeitos práticos serão: (i) Aumento dos ativos fiscais; (ii) Risco de realização de ativos; e Volatilidade patrimonial.

Além disso, os efeitos  financeiros e de valuation poderiam apontar: (i) Empresas com dificuldade em realizar seus créditos fiscais poderão sofrer redução em seu lucro líquido e aumento na volatilidade do resultado; (ii) Em processos de avaliação de valor das empresas, o estoque de ativos fiscais precisará ser ajustado para refletir apenas créditos realizáveis, sob pena de superavaliação patrimonial.


Luiz Roberto Peroba é Sócio/Tax Partner no Pinheiro Neto. Assessora clientes nacionais e estrangeiros de diversas indústrias, tanto em consultoria/planejamento tributário como contencioso, em disputas administrativas e judiciais.


Os artigos escritos pelos “colunistas” não refletem necessariamente a opinião do Portal da Reforma Tributária. Os textos visam promover o debate sobre temas relevantes para o país.

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