
Por Douglas Rodrigues, de São Paulo
Aumento no contencioso é esperado e considerado normal para o início da transição tributária, afirma o Secretário Extraordinário para a Reforma Tributária, Bernard Appy. Ele explicou que o novo modelo de tributação está sendo estruturado para evitar múltiplas fiscalizações e autuações sobre a mesma base tributável por diferentes entes da federação:
“Tem dois contenciosos: contencioso administrativo e contencioso judicial. No contencioso administrativo, todo o processo está sendo desenhado para que, tanto na fiscalização quanto no lançamento, não tenha, por exemplo, índice da federação, indo lá fiscalizar e, eventualmente, autuando a empresa sobre a mesma materialidade. Então, o texto vai deixar claro, inclusive, no PLP 108”.
No início da implementação também são esperados um aumento nas dúvidas e contestações. Porém, a tendência é de que o contencioso tenha uma redução drástica a longo prazo devido à maior simplicidade e uniformidade das novas regras tributárias. Appy disse também que, hoje, a maior parte dos litígios atuais envolvendo ICMS e PIS/Cofins gira em torno do que gera ou não direito a crédito tributário. No novo sistema a regra será simplificada: tudo gera crédito, exceto itens de uso e consumo pessoal.
As falas ocorreram no escritório Demarest Advogados, em São Paulo, na manhã de sexta-feira (27.jun.2025), em evento mediado pelos sócios Marcelo Guaranys e Douglas Mota. O episódio também ficou marcado pelo anúncio de uma nova sócia no escritório: Luiza Lacerda, profissional com mais de 20 anos de experiência na área tributária.
O que há por vir
Appy comentou que os dois projetos de lei ainda pendentes de aprovação são o que cria o Comitê Gestor, cuja aprovação estava prevista para junho, mas foi adiada para agosto, e o que institui o Imposto Seletivo:
“O que eu acho mais importante para o setor privado é o que define as alíquotas do imposto seletivo. Então, na fase de incidência, os produtos sobre os quais vai incidir o Imposto Seletivo já estão definidos na Lei Complementar 214, mas falta ainda definir quais são as alíquotas que incidirão. O trabalho técnico está bem avançado, que é basicamente criar várias alternativas para levar para a decisão política dentro do desenho do imposto seletivo”.
Appy explicou também que o Imposto Seletivo serve justamente como um resíduo que desestimula o consumo de produtos e serviços considerados prejudiciais para saúde e meio ambiente. O secretário reforçou que o pré-Comitê Gestor já está em funcionamento.
Outro trabalho que ocorre juntamente aos dois projetos citados é a elaboração de sistemas, a chamada área operacional. O desenho dos sistemas está sendo feito conjuntamente entre Receita Federal e estados e municípios, estes que por sua vez estão atrasados por conta da implementação do Comitê Gestor.
Split Payment
O período de testes do Split Payment está previsto para 2026, inicialmente aplicado às empresas B2B. A implementação completa do projeto deve ocorrer de forma gradual, com conclusão provável em 2027.
Documentos fiscais eletrônicos
Ao ser questionado sobre setores atualmente desobrigados de emitir documentos fiscais eletrônicos, como os de aluguel e infraestrutura, o secretário esclareceu que essas empresas passarão a ser obrigadas a emitir documentos fiscais a partir de 2027, com um período de adaptação previsto até o final de 2026.
A base para isso deve ser a Nota Fiscal de Serviços Eletrônica (NFS-e), com ajustes simples para se adequar às novas regras.
Infraestrutura
Atualmente, reembolsos de despesas, comum em setores como o de aluguel, onde valores como IPTU e condomínio são repassados ao cliente, não integram a base de cálculo de PIS e Cofins.
Com o IBS e CBS, a tendência é que passem a compor a base, exceto quando a despesa estiver claramente identificada como de responsabilidade do cliente e emitida em seu nome: nesse caso, pode haver dedução.
B2B
Ao ser questionado sobre a obrigação de registro de empresas estrangeiras no Brasil, conforme os artigos 21 e 22 da nova lei, Appy esclareceu que não há obrigação de registro para essas empresas que vendem mercadorias e passam pelo desembaraço aduaneiro tradicional:
“Quando o fornecedor estrangeiro fornece diretamente para a empresa brasileira, o seu exemplo de software, por exemplo, ou prestação de serviços, em princípio, sim, o fornecedor estrangeiro tem que se registrar como contribuinte no Brasil. A responsabilidade é do adquirente, mas ele tem uma responsabilidade solidária, neste caso. Agora, o que tem de entender é que esse processo de registro vai ser muito simples”.
Créditos tributários
Sobre as preocupações relacionadas à amplitude real do direito a crédito no novo sistema tributário, Appy deixou claro que o novo modelo foi intencionalmente desenhado para evitar essas distorções: “A gente foi pela linha só não dá crédito aquilo que é de uso e consumo pessoal”.