Colocando a “mão na massa” para implementar o Split Payment

Caroline Souza, CFO na ROIT

Por Caroline Souza e Juliana Zobaran 

O Split Payment, um mecanismo tributário amplamente adotado em países da União Europeia, está se consolidando como uma peça fundamental na modernização do sistema tributário brasileiro. Com a implementação da Reforma Tributária, a adoção desse sistema não apenas simplifica a arrecadação de tributos, mas também reduz evasão fiscal e melhora o compliance das empresas. 

Este artigo analisa o Split Payment e a reforma tributária, aprofundando a compreensão de seus mecanismos, benefícios e desafios, e principalmente impactos na vida real, pensando no dia-a-dia e a nossa mão na massa com time tributário, e demais times correlacionados, como o financeiro.

Resumo do mecanismo e benefícios:

O Split Payment, como já comentado inclusive pelo Daniel Loria, ex-diretor da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária, em suas palestras, é um sistema de pagamento que separa automaticamente o valor de uma transação em duas partes: uma destinada ao fornecedor e outra destinada diretamente ao governo para o pagamento de tributos. Assim, ao invés do fornecedor recolher o imposto e repassá-lo ao governo posteriormente, uma parte do pagamento já é direcionada ao Fisco, no ato da liquidação financeira. Essa separação, garante maior transparência e segurança nas operações, minimizando a sonegação e erros no recolhimento de impostos.

Para as empresas, o Split Payment oferece uma série de vantagens, como:

  • Aumento da segurança: elimina o risco de desvios de recursos destinados ao pagamento de tributos.
  • Conciliação bancária: separa os valores referentes aos impostos, tornando a conciliação mais eficiente.
  • Melhoria no compliance: auxilia as empresas a se manterem em conformidade com a legislação tributária.

Simplificação e desafios:

A reforma tributária, visa simplificar o complexo sistema tributário brasileiro, unificando impostos e reduzindo a burocracia. As mudanças propostas trarão impactos significativos para empresas de todos os setores, exigindo adaptação e planejamento.

Entre os principais desafios da reforma tributária, destacam-se:

  • Transição complexa: a mudança para o novo sistema requer planejamento e adaptação por parte das empresas.
  • Unificação de impostos: a unificação de diferentes impostos pode gerar incertezas sobre as alíquotas e a carga tributária final.
  • Combate à sonegação: a reforma precisa ser acompanhada de medidas eficazes para combater a sonegação fiscal.

Sinergia promissora

A combinação do Split Payment com a reforma tributária apresenta um potencial sinérgico para a modernização do sistema fiscal brasileiro. O Split Payment, integrado ao novo sistema tributário, pode contribuir para:

  • Aumento da arrecadação: aumenta a eficiência na arrecadação de impostos, combatendo a sonegação e a evasão fiscal. Este aumento arrecadatório pode impactar em redução da alíquota global do IVA (CBS e IBS)
  • Simplificação do processo: facilita o recolhimento de tributos, tornando o processo mais transparente e menos burocrático (Em 2033, claro)
  • Redução de custos: diminui os custos de compliance para as empresas, liberando recursos para investimentos e crescimento. (Em 2033, claro)

O futuro 

O Split Payment, como apontado por diversos especialistas da área tributária, tende a ganhar cada vez mais espaço no Brasil, impulsionado pela Reforma Tributária e pela crescente digitalização da economia. A tecnologia, com soluções inovadoras como as oferecidas pela ROIT, será fundamental para a implementação e o sucesso do Split Payment em diversos setores.

Ok, mas e o Split Payment, “mão na massa’, como posso me preparar?

Para entender a aplicabilidade do Split Payment, é fundamental explorar suas diferentes modalidades e implicações práticas.

Split Simplificado: esta é a forma mais básica do Split Payment, onde o valor da transação é dividido em duas partes: o valor líquido a ser pago ao fornecedor e o valor correspondente aos tributos a serem recolhidos. Será aplicado especialmente para as operações em que o adquirente seja não contribuinte de IVA, e a alíquota será padrão (única) calculada e divulgada pelo Comitê Gestor do IBS, para o IBS, e pela RFB, para a CBS;

Split Inteligente (Débitos e Créditos): o Split Inteligente vai além da simples divisão com alíquota padrão, aplicável ao varejo (venda para não contribuines). Ele considera a dinâmica de débitos e créditos tributários. Por exemplo, se o fornecedor gerou créditos tributários, após a efetiva liquidação de IVA, o Split Inteligente já poderá ajustar o valor a ser recolhido, otimizando o fluxo financeiro e evitando recolhimentos indevidos.

Split Super Inteligente (débitos e créditos em tempo real): levando a inteligência a um novo nível, o Split Super Inteligente opera em tempo real. Ele verifica a situação fiscal do fornecedor no momento da transação, considerando os débitos e os créditos tributários atualizados. Isso garante a máxima precisão no recolhimento de impostos e minimiza o risco de problemas fiscais. Esta metodologia está mais distante da realidade, mas em pauta para que a aplicação seja viável. Se puder ser implementado, ainda que algum tempo depois, seria uma verdadeira obra-prima, uma vez que funcionaria em tempo real, verificando a situação fiscal do fornecedor antes de efetuar o recolhimento do tributo;

Split ‘Manual’: em algumas situações, pode ser necessário realizar o pagamento do tributo de forma manual. Isso pode ocorrer em casos de transações complexas (sem documento fiscal, como, por exemplo, mútuo oneroso) ou quando os sistemas automatizados não conseguem processar a operação corretamente e também nas operações com pagamento em espécie ou cheque, onde não há automação processando tal pagamento. Nestes casos, o pagamento do tributo exige atenção redobrada para garantir a correta separação dos valores e o cumprimento das obrigações fiscais. Em evento da KPMG, com convidados como a SERPRO (desenvolvedora do ambiente GOV, ECAC, dentre outros), a ROIT, empresa de tecnologia que detém um ecossistema para a REFORMA TRIBUTÁRIA, foi comentado que a SERPRO já está prevendo o desenvolvimento de metodologias para criar um ROC (Registro de Operação de Consumo) para padronizar as operações e servir de base para o recolhimento do IVA;

A implementação desses diferentes modelos, seja qual deles venha a ser adotado, exigirá ajustes nos contratos comerciais e na infraestrutura tecnológica das empresas para garantir conformidade e previsibilidade tributária.

Após entender os modelos de Split Payment, é importante aprofundar onde esta metodologia impactará nossa rotina:

O Split facilitará o compliance do pagamento dos créditos de IVA (IBS, CBS) pelos fornecedores: com a Reforma Tributária, o Split Payment se torna um aliado crucial para o compliance do pagamento, da liquidação efetiva, dos créditos de IVA (IBS, CBS). Ao garantir que os tributos sejam recolhidos corretamente, o Split Payment facilita o processo de aproveitamento de créditos pelas empresas, evitando problema com a fiscalização.

Necessidade de conciliação dos créditos advindos do Split na apuração assistida: a apuração assistida, que busca simplificar o processo de apuração de tributos, se beneficia do Split Payment. No entanto, é fundamental realizar a conciliação dos créditos advindos do Split para garantir a precisão dos cálculos e evitar inconsistências.

Necessidade de vínculo 1:1 dos documentos fiscais com a operação financeira, para garantir o crédito de IVA (IBS, CBS): para garantir o aproveitamento dos créditos de IVA (IBS, CBS), é essencial que haja um vínculo individual (1:1) entre os documentos fiscais e a operação financeira correspondente. O Split Payment, ao registrar a transação e o recolhimento dos tributos, facilita esse vínculo, proporcionando maior segurança e transparência.

Necessidade de ajustar contratos para garantir que a falta de pagamentos dos tributos dos fornecedores serão ajustados comercialmente: empresas precisarão revisar cláusulas de pagamento, assegurando que a separação do tributo não gere impactos negativos nas relações comerciais. A implementação do Split Payment  exigirá uma revisão dos contratos com fornecedores e também com os seus clientes. É importante prever cláusulas que citem as responsabilidades de cada parte em relação ao recolhimento dos tributos e que estabeleçam mecanismos para ajustar comercialmente situações em que o fornecedor não cumpra com as suas obrigações fiscais. Uma opção que poderá ser adotada é aquela onde o tomador do serviço, pode ficar responsável pelo pagamento dos impostos nesta nova relação jurídica.

Necessidade de rever o fluxo de caixa das empresas: nos países onde o Split Payment foi adotado, muitas empresas relataram dificuldades na gestão do capital de giro, pois parte do pagamento é retida automaticamente.

 O Split Payment altera significativamente o fluxo de caixa das empresas, pois os tributos são pagos instantaneamente, reduzindo a liquidez disponível. Isso exige ajustes na gestão financeira e no planejamento tributário, como: (i) Análise de impacto nos ciclos financeiros para evitar falta de caixa devido à retenção imediata dos tributos; (ii) Novos métodos de financiamento para suprir necessidades de capital de giro, considerando que o imposto já não estará disponível para uso temporário e (iii) Modelos preditivos no ERP para estimar o impacto do Split Payment nas contas bancárias, ajustando as previsões de pagamento.

Necessidade de Integração com ERPs e Sistemas Contábeis: 

  1. Automação da Separação do Pagamento. Os sistemas precisarão ser adaptados para dividir automaticamente os valores pagos, alocando corretamente as parcelas destinadas ao fornecedor e ao fisco. Isso envolve (i) Parametrização dos módulos de Contas a Pagar e Contas a Receber; (ii) Configuração de alíquotas dinâmicas que podem variar conforme o tipo de operação e o ente arrecadador (CBS e IBS) e; (iii) Criação de relatórios de auditoria para rastrear e validar os valores pagos automaticamente.
  2.  Criação de Novas Contas Contábeis e Centros de Custo

As Empresas precisarão estruturar novas contas contábeis específicas para o IBS e CBS, separando claramente os valores recolhidos via Split Payment.

Nos sistemas de controle de centros de custo, o impacto da tributação por região e tipo de operação precisará ser parametrizado para garantir relatórios de desempenho financeiro coerentes.

  1.  Conciliação Automática dos Pagamentos com a Receita Federal e Comitê Gestor do IBS

O novo modelo exige que os sistemas sejam capazes de conciliar os valores pagos automaticamente com os registros fiscais do governo. Neste sentido, as empresas precisarão implementar APIs e integrações diretas com os sistemas da Receita Federal e do Comitê Gestor do IBS.

Abaixo desenho ilustrativo do funcionamento do Split Payment:

Conclusão

O Split Payment e a reforma tributária representam um passo importante para a modernização do sistema fiscal brasileiro. A introdução do Split Payment no Brasil não é apenas uma mudança fiscal, mas uma transformação estrutural no modelo de reconhecimento contábil e na gestão financeira das empresas. A combinação dessas ferramentas, aliada à expertise de profissionais da área de Tax, oferece uma oportunidade única para construir um sistema tributário mais justo, eficiente e transparente, impulsionando o crescimento econômico e a competitividade do país. A compreensão das diferentes modalidades do Split Payment e suas implicações práticas são fundamentais para que as empresas possam se adaptar e aproveitar ao máximo os benefícios dessa inovação. Empresas que se anteciparem e investirem na automação de seus sistemas estarão melhor preparadas para os desafios operacionais do período de transição, garantindo compliance, eficiência operacional e previsibilidade financeira.  O que sua empresa está fazendo para se preparar para essa transformação?


Caroline Souza é sócia na ROIT, CFO, líder do tema reforma tributária. Contadora e Advogada, MBA em planejamento, professora Contabilidade Facilitada, FBT, IPOG, Trevisan, palestrante, VP de finanças na Assespro-PR.

Juliana Zobaran é executiva C-Level. Advogada, contadora e Diretora LATAM & Mexico de Impostos do Grupo Vantiva. Vice-Presidente do Capitulo Latam Tax Executives Institute, com mais de 25 anos de experiência na área Jurídica e Tributária, com LL.M em Direito Empresarial pelo IBMEC e MBA em Gestão Tributária pelo FIPECAFI e Program Management Excellence pelo Gordon Institute of Business Science na Africa do Sul e M&A Strategist pela Harvard Business School.


Este artigo foi publicado anteriormente na 3ª edição da Revista da Reforma TributáriaClique aqui para assinar e receber as próximas edições.

Rolar para cima