
Por Luiz Renato Hauly e Felipe Zanchin Sardagna
Grande mudança proposta pela Reforma Tributária é a adoção do “Princípio do Destino”. Pela diretriz, IBS e CBS serão calculados pelas alíquotas vigentes no local de destino da operação, e a arrecadação pertencente ao Estado e Município correspondente.
O princípio se coaduna com a promoção da isonomia concorrencial e da descentralização da arrecadação. Porém, pode enfrentar alguns desafios para sua implementação, como no caso dos serviços digitais.
Em geral, o destino de um serviço pode ser definido pelo local: onde é executado; ou onde o tomador do serviço é domiciliado. No caso dos serviços digitais, por não haver local físico da sua execução, resta apenas conhecer o domicílio do tomador, o que pode ser de difícil constatação quando não há um vínculo próximo entre as partes.
Para tais casos, a Lei Complementar nº 214/2025 autorizou que o destino da operação fosse definido pelo prestador de serviço conforme indicação semelhante de ao menos dois dos seguintes critérios: a) endereço declarado pelo cliente; b) endereço coletado a partir de outras informações relevantes para a operação; c) endereço do adquirente informado pelo meio de pagamento; ou d) endereço de IP de dispositivo eletrônico ou obtido por geolocalização.
Tais critérios auxiliam a minimizar a insegurança que pode haver em situações complexas, todavia, não impedem a indução “artificial” do domicílio com o fim de obter carga tributária reduzida. O adquirente poderia utilizar VPN’s, por exemplo, para atrair a aplicação de alíquota menos gravosa, colocando em xeque o ideal de neutralidade. Em tais casos, percebida a suposta fraude, seria possível cobrar os respectivos tributos do fornecedor?
Primeiramente, diz-se “suposta fraude”, pois a definição de domicílio é complexa. Sua constatação pode depender de aspectos subjetivos e a legislação ainda permite a manutenção de mais de um domicílio. Já quanto à cobrança, não soa razoável penalizar o fornecedor por artifícios empregados pelo cliente para obtenção da vantagem, a menos que comprovada a sua corroboração para tanto.
Note-se que a situação induz a uma lacuna, pois nem mesmo o cliente poderia, a princípio, ser cobrado, visto que não é contribuinte de IBS e CBS, mas mero consumidor.
Em suma, apesar dos grandes benefícios proporcionados pela adoção do princípio do destino, verifica-se que sua implementação poderá encontrar desafios pontuais. A legislação não apresenta soluções expressas para o caso dos serviços digitais, de modo que os desdobramentos deverão ser definidos no âmbito da aplicação da lei, conjugando normas e ponderando princípios.
Para a solução, entende-se essencial ter em consideração as estritas atribuições impostas pela lei ao fornecedor para a definição do destino da operação, sendo incabível atribuir-lhe responsabilidade por ação do cliente para obter redução da carga tributária, salvo se comprovada a sua atuação em conluio.
Entende-se pertinente, por exemplo, a atuação do Comitê Gestor do IBS para mediar a situação, definir o ente que fará jus ao tributo e como efetuar a compensação caso já tenha havido repasse da arrecadação. Porém, resta indefinido como e de quem eventual diferença poderia ser cobrada.
Luiz Renato Hauly, economista, advogado (OAB/PR nº 89.415), MBA em Gestão Pública pela FGV/SP e Diretor do Movimento Destrava Brasil.
Felipe Zanchin Sardagna, advogado, pós-graduando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET e pesquisador do Instituto Destrava Brasil.
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