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Entrevista: Receita quer testar CBS/IBS na NF com 500 empresas, diz Marcos Flores

Por Enzo Bernardes

A Receita Federal convidará 500 empresas para participar dos testes dos sistemas relacionados aos novos campos previstos de IBS e CBS na nota fiscal, afirmou Marcos Flores, auditor-fiscal e responsável pela implantação da reforma tributária no âmbito tecnológico do Fisco.

O primeiro sistema será homologado em maio, e os convites para participação nos testes serão feitos ao longo dos meses de maio e junho. Por meio de associações, federações e confederações, a Receita Federal selecionará empresas com boa governança e estrutura organizacional para integrar um projeto-piloto em ambiente de produção restrita: 

Todos aquelas que já participam dos ambientes, das versões de teste do SPED, receberão o convite. Aquelas que já participam também do CONFIA, o Programa de Conformidade da Receita, receberão o convite. E claro, vão participar se quiserem”.

Os testes, que começarão em julho, serão de fluxo de processo –e não máquina a máquina, estes devem se iniciar apenas em agosto. Os ensaios vão evoluindo juntamente aos sistemas, sendo aprimorados com auxílio de observações das empresas.

Marcos esclareceu que nenhum convite formal foi enviado às empresas ainda. Até o momento, a Receita já informou às empresas do Confia ou que já participam do desenvolvimento dos SPEDs que elas serão convidadas.

Em entrevista ao Podcast Tax Capital, que contou com mediação do editor-chefe do Portal, Douglas Rodrigues e da presidente da WLF, Kaliane Abreu, Marcos Flores falou sobre os principais pontos da reforma tributária do consumo no âmbito da Receita Federal.

Confira os principais tópicos da conversa (se preferir, ouça abaixo no Spotify):

O trabalho da Receita Federal

Marcos afirmou que a conclusão do projeto da reforma tributária do consumo é fruto de um grande trabalho que a Receita Federal vem fazendo desde as últimas décadas passadas. Para ele a reforma foi um “processo de amadurecimento”:

A gente começa a discutir um número de PEC, um número de projetos de lei, aquela PEC não vai adiante, mas depois surge outra que parte do aprendizado anterior. Então a Receita participou de todo esse processo, muito discutido com a sociedade, com as administrações tributárias das outras esferas, de estados, de municípios, com empresas, com associações, com os meios de comunicação. É um longo processo de discussão com a participação de todos”.

Notas fiscais

Recentemente, a Receita Federal tem emitido diversas notas técnicas com o objetivo de adequar os documentos fiscais às novas exigências e campos relacionados ao IBS e à CBS:

A legislação traz o comando de que quem cumprir a obrigação acessória em 2026 não precisa recolher, e a obrigação acessória que nós entendemos que deve ser cumprida é emitir o documento fiscal com destaque de CBS e de IBS. Então esse seria um trabalho que já deveria estar sendo feito agora”.

Marcos explica que as empresas têm duas principais tarefas relacionadas ao âmbito: adequar o seu sistema emissor de notas fiscais e preparar os seus sistemas para o CNPJ alfanumérico:

Deve entrar na metade do ano que vem (CNPJ alfanumérico). É necessário porque o número disponível de CNPJs estava chegando no final, tanto para matrizes quanto para filiais e nós vamos ter um grande número de contribuintes que vão passar a usar a CNPJ com a reforma”, complementa.

Ele explica que os contribuintes são pessoas físicas que desempenham atividades que darão direito a crédito de IVA: profissionais liberais, produtores rurais, locadores com mais de 13 imóveis, autônomos. Para fins de IVA, essas pessoas terão direito a crédito e também recolherão.

Municípios que possuem uma nota fiscal de serviço própria terão de se adequar à nota nacional. Marcos acredita que aqueles que não possuem uma nota própria, devem migrar diretamente para a nota fiscal de serviço nacional. 

Em casos de descumprimento de obrigações acessórias, as empresas podem sofrer penalidades, podendo até ser lavrada. Marcos explica que mesmo que seja possível, essa não é a intenção do Fisco e nem é a maior problema para as empresas:

Eu acredito que a maior penalidade para ela seria não conseguir faturar no dia primeiro”, explica.

Split Payment

A Receita Federal e o Serpro já estão desenvolvendo os diversos módulos dos sistemas da CBS. No entanto, o módulo referente ao Split ainda depende de definições da arquitetura do sistema. Esse processo está sendo conduzido pela Secretaria Especial da Reforma Tributária (SERT), com a participação da Receita, dos estados, dos municípios e do Serpro:

Essa arquitetura vem sendo conversada, já está amadurecendo, e uma vez definido, batido o martelo, eu posso adiantar que muito provavelmente nós teremos uma plataforma governamental para lidar com essas informações, tanto para a Receita quanto para o Comitê Gestor, para interagir com os meios de pagamento”, disse.

O Split ainda está em fase de definição, mas o cenário mais provável é que ele seja implementado de forma facultativa no segmento B2B (entre empresas) a partir de janeiro de 2027. A decisão por uma adoção opcional busca atender às dúvidas do setor sobre a capacidade de todos os meios de pagamento estarem prontos até lá. Ao permitir que apenas quem estiver preparado implemente o sistema, o cronograma se torna mais flexível e evita a exclusão de agentes ainda em fase de adaptação:

E por que começar com o B2B, de empresa para empresa? Porque a empresa tem interesse no Split, ela quer o crédito, então é o segmento que se interessa pela implantação do Split. O consumidor não tem crédito, ele não está interessado no Split, não faz muito sentido para ele“, explica.

O que aconteceu de diferente

Marcos explicou que em projetos de reforma passados, o Brasil tentou criar “jabuticabas”: algo inovador, original e que existia apenas aqui, mas que não daria certo. Desta vez, em um trabalho em conjunto da Receita com o Congresso Nacional, técnicos, especialistas e a sociedade civil, o Brasil buscou lá fora o que funciona em termos de IVA, além de endereçar soluções que o restante do mundo ainda não conseguiu:

É o crédito financeiro, que acaba com o benefício econômico, do que lá fora chamam de fraude carrossel, aqui nota fria, conhecido de outra forma. Se criou soluções como o Split Payment, já existia pontualmente no mundo, mas a gente pode trazer para o Brasil amplamente a implantação  para que o crédito possa ser financeiro”.

Ele citou também a implementação do IVA não cumulativo, que só existe no Brasil, onde o IVA incide só sobre a margem. Para Marcos, tudo isso foi possível, pois o Brasil tem pré-condições boas, com documentos fiscais e eletrônicos disseminados por toda a economia e um setor financeiro muito forte, robusto e ágil. 

Além disso, muitas das soluções incluídas na reforma foram inspiradas na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).

Trabalho conjunto

O auditor explicou que dentro da Receita Federal, os grupos trabalham de “mãos dadas” para alcançar um melhor resultado no processo de implementação da reforma tributária. Marcos vem trabalhando com as equipes de desenvolvimentos de sistemas, e enfatiza a importância desse trabalho conjunto:

A gente conversa, e conversa várias vezes por dia, porque regulamentação e sistemas têm que conversar e estar de mãos dadas. Dentro da Receita estão diversos grupos, um para cada atividade, para cada capítulo, para cada sessão da Lei Complementar 214, que estão tratando de propor o regulamento. O ideal é que esse trabalho seja feito de mãos dadas com o IBS, com o Comitê Gestor”.

Sobre o Comitê Gestor, Marcos afirmou que o Fisco já vem conversando com representantes dos estados e municípios que fazem parte do Pré-Comitê Gestor.

Canal de dúvidas

Como dito pelo secretário especial extraordinário para a reforma tributária, Bernard Appy, o Fisco abrirá um canal para as empresas fazerem consultas e tirarem dúvidas. De acordo com Marcos, o canal deve ser inaugurado agora em maio e servirá para esclarecer dúvidas de um segmento inteiro:

Muitas vezes as dúvidas de uma empresa se resolvem dentro do próprio setor, ou elas são conflitantes com dúvidas de outra empresa. As associações e confederações tem condições de mediar isso e fazer uma consulta mais concisa e completa, que esclarece melhor o setor”, completa.

RT PRO

As informações do episódio foram enviadas com exclusividade aos assinantes do RT PRO, o serviço premium de informações sobre mudanças tributárias no país. Conheça mais aqui.


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