
Por Vitor Canivello
Muito se tem falado sobre a “fase de teste” do IBS e da CBS em 2026. A cobrança simbólica de alíquotas reduzidas foi recebida por muitos como uma sinalização de simplificação tributária. No entanto, essa visão ignora um detalhe fundamental: a fase de transição da Reforma Tributária vai muito além do ano de 2026 — e carrega consigo desafios jurídicos, operacionais e econômicos que exigem atenção imediata.
Neste artigo, analiso as alíquotas de teste aplicáveis em 2026, a não incidência para o Simples Nacional, os regimes diferenciados, e o que realmente significa a tal “redução” durante a transição. Afinal, o regime especial já será aplicado a partir de 2026?
A Lei Complementar 214/2025 estabelece que, em 2026, os tributos federais e subnacionais sobre o consumo passarão a conviver com o novo modelo. No entanto, essa convivência começa de forma simbólica, com a aplicação das chamadas alíquotas de teste:
- CBS: 0,9% (art. 346 da LC 214/2025)
- IBS: 0,1% (art. 343 da LC 214/2025)
Essas alíquotas se aplicarão aos fatos geradores ocorridos entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 2026, servindo de ensaio operacional e tecnológico para o novo modelo. Apesar de baixas, essas alíquotas exigem dos contribuintes o cumprimento de obrigações acessórias plenas, como emissão de nota fiscal no novo padrão, apuração separada e envio das informações ao sistema centralizado da CBS e do IBS.
A fase de testes não ignora os setores que, já possuem tratamento diferenciado. O art. 348, III, alínea “a”, da LC 214/2025, confirma que as alíquotas reduzidas previstas para determinados segmentos também se aplicam em 2026. Exemplos de alíquotas diferenciadas nesse primeiro ano:
Segmento | CBS | IBS |
---|---|---|
Profissionais liberais | 0,63% | 0,07% |
Educação e saúde | 0,36% | 0,04% |
Medicamentos essenciais | 0,36% | 0,04% |
Alimentos e produtos de higiene | 0,36% | 0,04% |
Essas reduções refletem o mesmo percentual de desconto que será aplicado quando as alíquotas cheias entrarem em vigor — em regra, 60% ou até 100% de redução, conforme o caso. A base legal dessas reduções está na EC 132/2023, art. 9º, e na própria LC 214/2025, especialmente nos artigos 107 a 111 (CBS) e 183 a 188 (IBS).
As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional foram excluídas da aplicação das alíquotas de teste. Conforme o art. 348, III, “c” da LC 214/2025, esses contribuintes não estão sujeitos à CBS nem ao IBS em 2026, o que inclui:
- Isenção das alíquotas de 0,9% (CBS) e 0,1% (IBS);
- Dispensa das obrigações principais, desde que cumpridas as acessórias;
- Continuidade da apuração pelo regime unificado do Simples Nacional.
Essa regra preserva o tratamento favorecido e impede que pequenas empresas enfrentem custos de adaptação tecnológica prematura, em um momento ainda instável da transição.
Embora 2026 seja o primeiro ano de aplicação prática, o novo sistema só começa a ser implementado progressivamente a partir de 2027, com a substituição parcial do PIS/COFINS pelo CBS e do ICMS/ISS pelo IBS.
A base legal dessa transição está no art. 119 da EC 132/2023, que prevê a seguinte progressividade:
- 2026: Alíquotas de teste (CBS 0,9% e IBS 0,1%)
- 2027 a 2032: Substituição parcial dos tributos antigos pelos novos
- 2033: Substituição completa (fim do modelo antigo)
Durante a transição, as alíquotas cheias da CBS e do IBS começarão a valer gradualmente. Contudo, os percentuais de redução para setores diferenciados se manterão estáveis, conforme definido nos arts. 110 (CBS) e 188 (IBS) da LC 214/2025 — e também na EC 132/2023.
Ou seja: Sim, haverá redução durante toda a transição, mas não haverá novas reduções. Os percentuais definidos em 2025 não poderão ser ampliados nem estendidos a outros setores (art. 9º, §1º da EC 132/2023). Isso cria uma blindagem jurídica, mas também engessa o sistema, impedindo adaptações futuras mesmo que surjam distorções econômicas ou sociais.
Outro ponto relevante da LC 214/2025 é a previsão de dispensa do recolhimento do IBS e da CBS para quem cumprir as obrigações acessórias previstas (art. 348, §1º). Ou seja, o contribuinte que enviar corretamente os dados exigidos pelas novas plataformas poderá ser dispensado do pagamento — o que reforça o caráter pedagógico do primeiro ano.
A ideia de que 2026 será apenas um “teste simbólico” é perigosa. O contribuinte que não se preparar desde já corre o risco de enfrentar, em 2027 e 2028, uma transição confusa e onerosa, especialmente com a convivência de dois sistemas tributários — o antigo e o novo.
As alíquotas reduzidas, por mais que permaneçam durante toda a transição, não representam um alívio permanente. Elas são parte de um projeto de simplificação formal, mas não necessariamente de simplificação econômica.
Em outras palavras: 2026 é o início de uma nova lógica tributária. E quanto mais cedo ela for compreendida, menores os riscos para quem empreende, apura e calcula.
Vitor Canivello é Senior Tax Supervisor na Deloitte.
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