Na Câmara, especialistas debatem gratuidade de APIs para contribuintes e alertam para desafios tecnológicos

Por Redação

A implementação da reforma tributária digital foi tema de audiência pública na 3ª feira (23.set.2025) na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, com participação de representantes do governo, especialistas e associações empresariais. Segundo o Fisco, os contribuintes não terão custo para acessar os sistemas. Especialistas alertam que a operacionalização do modelo, totalmente digital, enfrenta desafios tecnológicos significativos.

Sergio Sgobbi, diretor da Brascom, associação que representa empresas de software, destacou os impactos para pequenas e médias empresas e o mercado de tecnologia. “Hoje, estados e municípios têm condições diferenciadas para grandes emissores de notas. Eles emitem uma, duas notas por mês. A partir da individualização, terá que toda a operação ser emitida a nota. Isso gerará uma grande volumetria de notas e de documentos fiscais sendo intransitáveis”.

Ariadne de Santa Teresa Lopes Fonseca, diretora de Negócios Econômico-Fazendários do Serpro, explicou os esforços da estatal para garantir a infraestrutura necessária. “Temos hoje cerca de 200 pessoas alocadas full time ao projeto, são engenheiros de software, arquitetos, equipes de segurança, equipes de centro de dados, equipes de rede, todas dedicadas ao projeto reforma tributária”.

Ela citou o ambiente de pré-produção tem 500 empresas se candidatando a usar o sistema. Ela acrescentou que o sistema está nas fases finais de teste e homologação, preparando o ambiente para a virada de 2026.

Juliano Brito, Subsecretário de Gestão Corporativa da Receita Federal do Brasil, reforçou a gratuidade do sistema. “A Receita Federal não cobra, nem jamais cobrará qualquer valor para que um contribuinte cumpra com as suas obrigações tributárias”. Segundo ele, não haverá custo para encaminhar o documento fiscal, para acessar a plataforma de compensação de tributos, para consultar os créditos e cumprir com as obrigações da reforma tributária. Ele explicou ainda que apenas o acesso massivo e automatizado às APIs de alta performance poderá gerar custo, para ressarcir o Serpro pelos investimentos tecnológicos.

Lucas Ribeiro, especialista em tecnologia tributária e CEO da ROIT, destacou a importância da definição clara das regras para evitar problemas na implementação. Ele elogiou o trabalho conjunto do Serpro e da Receita Federal na calculadora de tributos, já disponível com APIs gratuitas.

Uma API gratuita por dia é suficiente, segundo o CEO da ROIT, para atender 99,8% das empresas brasileiras. As demais querem e podem pagar, por um serviço premium. A avaliação é de que repassar todo o custo de tecnologia para o setor público porque dificultar a inovação e elevar o gasto à população em geral (via mais impostos). “Há uma pequena parcela, sim, de grandes contribuintes que estão dispostos a terem serviços de maior qualidade, de maior disponibilidade, de maior possibilidade de conexões, de acesso a dados, para que nós não precisemos desenvolver mecanismos acessórios, robotizar, fazer aquilo em paralelo, como o Juliano muito bem colocou no início”, falou.

Além disso, segundo Ribeiro, a disponibilização das regras de negócio pelo fisco permitirá diminuir gastos com motores de cálculo e com equipes dedicadas a alimentar sistemas tributários, já que parte dessa responsabilidade passa a ser assumida pela administração pública.

O executivo ressaltou, porém, que ainda há gargalos importantes, principalmente na obtenção de informações de notas fiscais de serviços emitidas por municípios. “Hoje, para nós acessarmos as notas fiscais de serviços tomados dos 5.572 municípios é uma insanidade. Precisamos desenvolver sistemas de inteligência artificial para extrair dados de PDFs e XMLs fora de padrão, o que gera insegurança jurídica e instabilidade”, disse. Ele defendeu a padronização nacional das notas fiscais de serviço como medida essencial para melhorar a qualidade e reduzir custos.

Ribeiro também chamou atenção para o impacto da reforma sobre a gestão das empresas, especialmente as de menor porte. Para ele, muitas companhias ainda mantêm uma contabilidade “para inglês ver”, feita de forma tardia e precária. “As empresas vão precisar se adequar, mexer em cultura, em processos e em prazos, mas lá na frente vamos ter um ganho muito expressivo, com contabilidade regular e integração entre dados fiscais e financeiros”, afirmou. Ele defendeu a proposta de emenda apresentada no Congresso que garante acesso gratuito mínimo às APIs, e concluiu dizendo que a reforma não é apenas tributária, mas também uma mudança estrutural para o país.

Marcelo Almeida, diretor de Relações Governamentais e Institucionais da Associação Brasileira das Empresas de Software (Abes), alertou que a regulamentação não pode gerar barreiras tecnológicas nem aumentar custos para as companhias. Ele ressaltou que, embora o setor de tecnologia esteja preparado para apoiar a transição, há preocupação de que exigências adicionais criem complexidade desnecessária e sobrecarreguem as empresas com novas despesas.

Rafael Sebben, Diretor de Assuntos Legislativos da Federação Nacional das Empresas de Informática (Fenainfo), chamou atenção para os prazos e a complexidade operacional da reforma). Disse que muitas empresas e cidades não estão preparadas para a mudança em janeiro de 2026. Segundo ele, os portais públicos não estão com todos os sistemas disponíveis para testagem das empresas de tecnologia.

Sebben alertou ainda que o setor precisa ter certeza dos serviços de uso de dados que poderão ser cobrados e o que não poderá ser cobrados. Um pleito por nós enviado aos senadores foi parcialmente acatado.

A audiência foi solicitada pelos deputados Luiz Carlos Hauly (Pode-PR), Sargento Portugal (Pode-RJ), Júlio Cesar (PSD-PI) e Any Ortiz (Cidadania-RS).

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