
Por Silvia Wilbert
A aprovação da reforma tributária marca um momento histórico para o ambiente de negócios no Brasil. Ao redesenhar a lógica de arrecadação e simplificar tributos que há décadas sufocavam a produtividade, o país dá um passo importante para reduzir a insegurança jurídica e tentar modernizar sua economia. Mas há um ponto que precisa de reflexão crítica: como essa nova realidade impactará as médias empresas em recuperação judicial, segmento que representa a espinha dorsal da indústria e dos serviços nacionais.
O discurso oficial aponta que a unificação de tributos trará eficiência e transparência. Em tese, isso beneficia todos. Contudo, para empresas em crise, especialmente as médias, a transição exigirá mais que boa vontade. A mudança do regime de apuração para um modelo baseado em débito e crédito fiscais pode, paradoxalmente, aumentar a pressão de caixa em quem já luta para sobreviver.
A recuperação judicial é, em essência, um mecanismo de reequilíbrio: dar fôlego para pagar credores e permitir a reestruturação da operação. Ocorre que muitas médias empresas operam com margens estreitas e capital de giro comprometido e extremamente limitado.
O IVA, embora mais racional, exigirá disciplina fiscal rigorosa e ajustes no fluxo de caixa. Se antes parte dos tributos era diferida ou negociada, agora haverá menos margem de manobra. Para quem já caminha no fio da navalha, isso pode representar uma barreira adicional.
Empresas em recuperação judicial já possuem uma imensa dificuldade de acesso ao crédito.Isso porque há uma classificação de Risco, Resolução CMN 2.682/1999 e atualizações, que regula que toda operação de crédito deve ser enquadrada em níveis de risco (AA a H), e empresas em RJ são classificadas nos níveis mais baixos (E, F, G ou H), isso obriga os bancos a provisionar 70% a 100% do valor emprestado, o que desestimula totalmente a concessão. Com essa limitação, na prática, empresas em recuperação judicial recorrem a fundos, securitizadoras, fornecedores estratégicos ou ao DIP Financing para levantar capital durante a RJ. Todavia, nestes agentes financeiros o crédito tende a ser mais caro.
Outro ponto relevante é que durante o período de transição da Reforma Tributária, entre 2026 e 2033, as médias empresas enfrentarão custos relevantes para administrar simultaneamente o sistema atual (PIS, Cofins, ICMS, ISS, IPI) e o novo modelo de CBS e IBS. Esse cenário exigirá dupla escrituração fiscal, adaptação de sistemas de ERP e compliance, além de treinamento constante das equipes contábil e fiscal para lidar com legislações sobrepostas e regras de creditamento distintas.
Somam-se ainda os gastos indiretos, como a necessidade de assessoria especializada, maior risco de autuações por erros operacionais e perda de eficiência administrativa, que podem comprometer a competitividade das médias empresas justamente em um momento de busca por maior produtividade e geração de caixa.
Por outro lado, é inegável que no longo prazo a simplificação tributária poderá reduzir custos indiretos. O excesso de obrigações acessórias, guias e sistemas paralelos sempre pesou mais sobre as médias empresas, que não dispõem de departamentos robustos de compliance. Nesse sentido, a reforma trará alívio. Menos complexidade significa menos risco de autuações e menos desperdício de energia administrativa, pontos que fortalecem a capacidade de recuperação.
Outro ganho potencial, mas também de longo prazo, está na maior justiça concorrencial. Hoje, médias empresas sofrem concorrência desleal tanto de grandes corporações- que dispõem de estruturas sofisticadas de planejamento tributário -quanto de informais que escapam da tributação. A padronização e a digitalização prometem nivelar esse jogo, tornando o mercado mais justo.
A questão não é se a reforma será boa ou ruim em si, mas como será implementada. Para médias empresas em recuperação judicial, o menor impacto dependerá de regras de transição claras e graduais, evitando choques bruscos de caixa; Linhas de crédito específicas para atravessar o período de adaptação; capacitação tributária acessível, já que o desconhecimento pode custar caro; políticas públicas complementares, que considerem a vulnerabilidade de empresas em RJ.
Em 2026 iniciará a reforma e não pode ser vista como um fim em si mesmo, mas como o início de uma nova etapa. Para que não se transforme em mais um fardo, precisa ser acompanhada de medidas de apoio direcionadas. O Brasil não pode desperdiçar o potencial de suas médias empresas, que são justamente as que mais empregam e inovam, mas também as que mais sofrem em crises.
A reforma, para empresas em recuperação judicial, tem se mostrado um ponto adicional de preocupação. Cabe ao legislador, ao mercado e às próprias empresas comunicarem adequadamente no momento de transição, e investirem esforços para que a promessa de simplificação e justiça fiscal não se torne apenas retórica, mas se traduza em competitividade real para as médias empresas.
Silvia Wilbert é Advogada e sócia-fundadora da Safegold.
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