
O ano de 2026 se aproxima e traz consigo um contexto corporativo singular. Além da implementação gradativa da Reforma Tributária do Consumo, o ambiente econômico discute simultaneamente a tributação de dividendos, revisões em regimes especiais, a reconfiguração de incentivos regionais e uma agenda eleitoral que tende a gerar oscilações relevantes no comportamento de mercado e nas expectativas de investidores.
Para completar, a curva tecnológica segue exponencial: automação fiscal, inteligência artificial aplicada à tomada de decisão, integração de dados financeiros e contábeis e novas plataformas regulatórias digitais, como o robusto sistema construído pela Receita Federal para monitoramento e apuração dos tributos advindos da Reforma Tributária.
Destaca-se ainda que nada disso ocorre de forma isolada, muito pelo contrário, cria um cenário convergente que pressiona processos, pessoas, modelos de governança e a própria capacidade de liderança das organizações.
É nesse ponto que a Reforma Tributária deixa de ser um projeto de adequação técnica e passa a ser um ponto de inflexão estratégico. A transição não trata apenas de troca de tributos, bases e alíquotas. Estamos diante de uma mudança que altera incentivos econômicos e redistribui riscos e benefícios na cadeia produtiva, abrindo espaço para revisão profunda do planejamento corporativo. Em muitos setores, práticas e regras que por anos sustentaram margens e decisões estratégicas como localizações geográficas e malha logística, sedem lugar a um ambiente mais neutro e comparável.
A pergunta que gestores seniores deveriam fazer não é “qual será a alíquota?”, mas sim: “qual será o desenho mais eficiente do meu negócio diante de novas regras, novos riscos e novas métricas?”.
Durante décadas, a gestão tributária foi predominantemente defensiva e orientada à mitigação de riscos. Agora, passa a influenciar decisões estruturantes: expansão geográfica, consolidação de operações, reorganização societária, revisão da cadeia logística, recomposição de margens e reconfiguração do portfólio. Nesse novo contexto, tributaristas que atuavam como especialistas normativos passam a ocupar lugar de analistas de impacto econômico, estrategistas financeiros e interlocutores diretos com conselhos e CFOs.
Esse movimento exige uma nova forma e um novo nível de governança dentro das empresas. A área tributária deve conduzir a agenda, sem dúvidas, mas não pode (e nem deve) fazer isso de forma isolada. Pricing, supply chain, controladoria, planejamento financeiro, jurídico, TI entre outras áreas passam a ter uma correlação direta com a área tributária e com a construção do planejamento estratégico das companhias para os próximos anos. Decisões tributárias passam a ter marca de origem estratégica e não operacional. E, nesse arranjo, a liderança executiva tem um papel determinante: estabelecer prioridades, garantir coordenação entre áreas, provocar simulações de cenário e dar velocidade a decisões críticas.
É preciso reconhecer que uma transição dessa magnitude também é emocional e cultural. Mudanças normativas tendem a gerar incerteza, insegurança e resistência natural ao ajuste do status quo. Nesse ambiente, líderes que comunicam com clareza, que trazem visão de futuro e que conduzem equipes com propósito reduzem ruídos, antecipam riscos e criam sensação de construção coletiva. O capital intelectual da transformação será tão importante quanto o capital financeiro alocado nela.
Ao mesmo tempo, o ciclo tecnológico reforça esse desafio. Ferramentas de simulação, integração de dados tributários com indicadores operacionais e soluções de automação fiscal deixam de ser diferencial e passam a ser requisito mínimo. A tecnologia não substituirá o olhar estratégico; ela ampliará a capacidade de decisão e reduzirá o custo do erro. A liderança precisa absorver esse ponto: investir em tecnologia não é custo — é proteção de margem futura.
Em paralelo, discussões sobre tributação de dividendos e revisão de regras sobre rendimentos societários geram, inevitavelmente, deslocamento de valor entre sócios, estruturas operacionais e planos de expansão. Em um ano eleitoral, esse redesenho pode ocorrer em ritmo acelerado e com impacto direto sobre valuation, governança e agendas de M&A. Mais uma vez, a alta gestão será cobrada não por ter a resposta perfeita, mas por conseguir definir direções estratégicas, medir impactos e conduzir a empresa com visão de longo prazo.
A Reforma Tributária — somada aos demais vetores transformadores — cria uma agenda estratégica que não será opcional. E essa agenda tem nome: liderança adaptativa. Empresas que tratam o tema apenas como conversão de sistemas ou como cálculo de perdas e ganhos desperdiçarão uma oportunidade rara. As que compreendem que se trata de uma reorganização estrutural fortalecerão seu posicionamento competitivo.
No fundo, a reflexão central é simples: não é a reforma que mudará as empresas; são as empresas que decidirão como transformarão a reforma em vantagem. A alta gestão tem a chance — e a responsabilidade — de guiar esse processo.
Este é um momento em que o tributário deixa de representar apenas compliance, risco e obrigações e passa a influenciar precificação, viabilidade de expansão, decisões de capital, geração de valor ao acionista e sustentabilidade financeira de longo prazo.
O mercado exigirá clareza, coerência e coordenação entre áreas. E a liderança — agora mais do que nunca — precisará ser capaz de não apenas interpretar o cenário, mas mobilizar equipes, comunicar visão, tomar decisões difíceis e conduzir empresas ao protagonismo.
A reforma será implementada. A tecnologia continuará avançando. As discussões sobre tributação de resultados evoluirão. Mas a forma como cada empresa atravessará esse ciclo dependerá diretamente da maturidade de sua liderança. Esse é o verdadeiro ponto de inflexão: transformar um ciclo de mudança normativa em um ciclo de crescimento estruturado.
Não há como negar que toda essa mudança e esse cenário transformará a forma como as empresas fazem negócio no Brasil e, por isso, é inegável que terão ganhadores e perdedores nessa verdadeira batalha, fica claro, portanto, que é o nível de preparação que vai definir de qual lado da mesa cada empresa estará.
Filho, irmão, marido e pai. É advogado tributarista com mais de 15 anos da experiência na área tributária com passagens por Big4 e multinacionais.
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