Precificação: o que muda com a reforma do consumo?

Maria Isabel Ferreira, sócia-líder de Tributos Indiretos da KPMG no Brasil

Por Maria Isabel Ferreira

Aprovada em 2023 a EC 132, a reforma tributária do consumo promove a substituição de cinco tributos indiretos por outros 5 de características completamente diferentes dos atuais. Dos cinco, vamos falar dos dois principais — a CBS, de competência federal, e o IBS, gerido por estados e municípios. Ambos seguem o modelo do IVA e, a partir de 2026, já deverão ser informados nos documentos fiscais de empresas de todos os portes e setores.

Mais do que uma mudança de regra tributária, a reforma representa uma ruptura conceitual que altera de forma relevante a lógica da precificação no Brasil. Ao adotar o princípio da transparência, trazendo o cálculo “por fora” dos tributos e da cobrança no destino, o novo sistema força uma reavaliação das estratégias de formação de preço, impactando desde a cadeia de suprimentos até a comunicação com o consumidor final.

Com a obrigatoriedade de explicitação dos tributos incidentes sobre bens e serviços na nota fiscal, digo aqui, incidência efetiva e não apenas informativa como acontece nos dias atuais, o preço final passa a refletir, de forma clara, a carga tributária embutida, será transparente para o adquirente e/ou tomador de serviços o que é preço líquido, o que é tributo e o que é preço bruto.

“A reforma tributária impõe uma revisão nas estratégias de precificação, com impactos diretos sobre margem de lucro, percepção de valor e competitividade.”

Além da questão da transparência em si, as organizações precisarão justificar o que entregam em termos de qualidade, experiência e proposta de valor, na medida em que o consumidor terá mais clareza sobre o peso da tributação na sua decisão de compra. Não menos importante, a mudança de regra de tributação de acordo com o destino do consumidor fará com que as empresas tenham a sua base de cadastro atualizada e fidedigna para que a regra tributária seja aplicada corretamente

Ainda, essa nova regra irá conviver por alguns anos com a regra atual e “antiga” em que o cálculo dos tributos sobre o consumo é realizado por dentro e definido de acordo com a origem do contribuinte. Essas duas diretrizes irão conviver ao longo do tempo, trazendo uma complexidade bastante relevante na gestão e na eficiência das áreas responsáveis pela determinação de preço.

Recomposição de preços e percepção de mercado

No curto prazo, a transição tributária exigirá recomposição de preços. Com a extinção de tributos como o PIS, a Cofins, o IPI, o ISS e o ICMS, será necessário avaliar os efeitos combinados da nova carga fiscal sobre cada item do portfólio.

A comunicação dessa recomposição deve ser feita com cautela. A nova estrutura tributária pode representar aumento, redução ou neutralidade na carga final — tudo dependerá do setor, do tipo de produto ou serviço e da organização da cadeia produtiva e do montante de crédito a ser apropriado.  Saber aplicar estratégia de preço, com as múltiplas combinações, harmonizando o sistema antigo com o sistema nova, convivendo ao mesmo tempo, será uma tarefa árdua, porém, essencial para preservação das margens.

Um novo mindset de precificação

Mais do que uma obrigação fiscal, a reforma tributária exige um novo mindset empresarial. Precificar, a partir de 2026, será um exercício técnico, estratégico e colaborativo entre áreas como finanças, comercial, marketing e tecnologia e essa estratégia deve ser desenhada muito antes de janeiro de 2026, diria que deveria ser já.

Empresas que se anteciparem e reestruturarem seus modelos de precificação com base no novo sistema tributário sairão na frente. Aquelas que deixarem para reagir depois da implementação da CBS e do IBS poderão comprometer sua competitividade — e, em última instância, sua sustentabilidade.


Maria Isabel Ferreira é sócia-líder de Tributos Indiretos da KPMG no Brasil.


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Este artigo foi publicado anteriormente na 3ª edição da Revista da Reforma TributáriaClique aqui para assinar e receber as próximas edições.

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